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segunda-feira, 30 de abril de 2007

BÓSNIA E OS REENCONTROS

SARAJEVO



A visita à Bósnia-Herzegovina marcou o meu regresso aos Balcãs, aos buracos, ao Burek e a um inesperado encontro. O país divide-se em dois estados, o estado de Bósnia e o estado de Herzegovina, Sarejevo é capital e situa-se no estado de Bósnia. Após o final da Guerra Fria, Sarajevo é agora uma cidade nova mas com muitas marcas das recentes brigas entre sérvios, croatas e bósnios. A diversidade religiosa é enorme, o islamismo é a aquela que aparenta ter mais poder, mas sendo a cidade fortemente habitada por sérvios, na sua maioria cristãos ortodoxos, e por croatas, maioritariamente católicos romanos, a estabilidade religiosa e o desenvolvimento económico-cultural deixa muito a desejar e a imagem que me ficou é que tudo está muito pouco organizado e as regras são poucas. No centro da cidade as pessoas pedem dinheiro, e junto dos mais adultos sempre se vêm também crianças esticando a mão na esperaça de receber uma resposta em troca, sinceramente fiquei com a ideia de que muitos deles nem sequer têm a noção do que fazem. Um rapaz, novito mas bem aparentado, de fato de treino e mochila da escola, completamente normalissimo, parecia ter acabado de sair da escola, e enquanto percorria o caminho até casa aproveitava para pedir dinheiro a todos aqueles que encontrava no caminho, fiquei com a nitida impressão que o fazia apenas porque havia crescido num mundo onde as pessoas o fazem, e fazem-no parecendo ser a coisa mais natural. E assim ele também fazia. E caminhando por entre as pequenas lojas de madeira do mercado central, os exemplos são muitos. Mas a minha experiência com dinheiros na Bósnia foi ainda maior. Chegámos num Sábado e sem pensar muito, apenas tinhamos na carteira forints húngaros, cedo percebemos que poderia ser um problema, todo o fim de semana não encontrámos quem nos aceitasse trocar forints por marcos bósnios. No Sábado conseguimos no hostel um empréstimo de 20 marcos, mas que pouco duraram (cerca de 10 euros), no Domingo previ dia dificil, andar ali sem dinheiro não era saudável e quase me senti obrigado a juntar-me aos outros na caça de alguns trocos. Mas por vezes as coisas são mesmo imprevisiveis e quando menos as espero, elas acontecem, ouço alguém chamar-me, de repente nem liguei, mas ouvi outra vez e para espanto meio, no meio de uma das ruas de Sarajevo encontro um colega conterraneo que já não avistava há muito. E mais palavras para quê! passado o espanto, seguem-se as cervejas e a tão preciosa troca de forints húngaros em marcos bósnios, a minha salvação na bósnia! Depois não podia deixar de aproveitar a ocasião para voltar a deliciar-me com o Burek, a semelhança da Sérvia, também na Bósnia o Burek é o forte da gastronomia e mais uma vez me babei por mais. Depois de me descalçar, entrei pela primeira vez dentro de uma mosquita, segundo li, a maior da Europa, à excepção das que existem na Turquia. Depois estivemos no local onde foi assassinado o arquiduque austro-húngaro e presumível herdeiro ao trono imperial dos Habsburgos, Franz Ferdinand. O assassinato marcou o arranque da primeira Guerra Mundial. De resto, foi bom subir um pouco de um dos montes que rodeiam a capital bósnia e olhar para o grande vale onde Sarajevo quis nascer.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

MURO DAS MEMÓRIAS

BERLIM



Escondidas numa Berlim agora completamente modernizada continuam as imensas memórias da actividade nazi, das guerras, da cortina de ferro. Escondidas ou nem tanto. Se por um lado me parecem, os berlinenses, querer fugir a tais antepassados, outros sempre haverão querendo neles entrar, e eu não pude deixar de o tentar fazer. Chegar, sentir o cheiro, sentir o palco de mil histórias da antiga alemanha que foram crescendo comigo e com certeza um pouco com todos nós, muitas vezes sem nelas pensar ou sem a elas dar muita importância. Ouvi falar de muitas histórias antes, mas agora é diferente, agora consigo quase sentir-me dentro delas, mesmo sabendo o quanto tudo mudou. Apesar dos anos que lá vão, dos montes de edificios apagados e dos novos que em seu lugar cresceram, do muro que já não existe, de uma Berlim de hoje completamente diferente do que era, apesar de tudo isto estando lá acaba-se sempre por sentir toda a energia e intensidade daqueles anos que teimam em não ser esquecidos ou posso dizer, nunca o serão. Entre Budapeste e Berlim ficam cerca de 900 km de estrada que atravessam 3 países antes de entrar a sul da Alemanha. Decidimos saltar para a estrada, esticar o dedo e esperar pela boa vontade dos condutores que passavam. O resultado, uma viagem longa, barata, e com algumas bons palmos de conversa com aqueles que pelo caminho nos partilharam o seu espaço. Gyor, Bratislava, Brno, Praga, Dresden e por fim a chegada. Em Berlim, o primeiro destino, casa da Kristina que nos deu um bocado do espaço do seu quarto durante estes três dias. Acabei por relacionar toda a vida e imagem do seu apartamento com as pessoas alemãs, sobretudo com a imagem que eu tenho das pessoas alemãs do pós-guerra. Esta realidade encaixou perfeitamente naquilo que meu imaginário havia criado. Tudo tão diferente, pintado, escrito, colorido... As pessoas, os cabelos delas, as roupas delas, tudo parece tão novo, tão aberto. Berlim é definitivamente uma cidade moderna, de mente aberta e onde as alternativas existem, Berlim não é uma cidade banal, Berlim é sem dúvida um lugar onde as ideias se sentem flutuar. Por outro lado, a Berlim de hoje deixou-me sentir um pequeno vazio, mas um vazio meu e egoista de quem quer saltar mais ainda para cima da história, ela estava lá, mas com o cenário completamente refeito, parecendo ter havido vontade de não deixar rastos de que algo se tenha ali passado. Mas sim, a cidade foi completamente destruida durante a segunda guerra e com certeza não há alemão que não tenha feito os possiveis para apagar qualquer vestigio da destruição. Há uma excepção, a Kaiser Wilhelm Gedächtniskirche (a Igreja das Memórias), foi deixada tal como ficou após a invasão dos Aliados, daí o nome que tem. Em plena Los Angels Platz, a Igreja das Memórias faz frente aos mais variados e exuberantes estilos modernos que os edificios em sua volta ostentam, mas que acabam desvalorizados no meio de magestosa mostra da realidade da guerra. A poucos metros da Los Angels Platz fica o Zoologischer Garten e a estação que não poderia deixar de me fazer recordar Christiane F. Daqui metade a pé e outra metade no autocarro 100 e ficámos em frente ao Reichstag. Depois, um pouco mais, passamos o Brandenburger Tor e acabámos em Alexander Platz a imaginar a vista que se poderá ter do topo da Fernsehturm (a Torre de Televisão). Depois caminhamos na rua Kastanienallee ao largo dos imensos e diversos bares e lojas. Berlim vale pela diversidade cultural resultante de um povo "renovado" e de mente aberta. Kristina contou-nos algumas histórias sobre as suas (más) experiências com alguns Nazis, ainda existe uma relativa comunidade em Berlim contra quem, segundo a Kristina, a policia parece continuar a travar lutas. A nosso último destino foi Kréuzberg, antes ouvimos falar muito desta zona da cidade e não fomos embora sem visitar, infelizmente deu apenas tempo para uma cerveja ao ritmo da Bundesliga, um café ruidoso onde fanáticos de futebol dividiam apostas. Berlim é uma cidade bonita, não da mesma forma que Budapeste é, mas de outra talvez mais importante. O regresso à Hungria não foi tão fácil como a ida para a Alemanha, mas por fim lá chegámos a casa... Satisfeitos.